Por
um motivo qualquer que me escapa, eu estava indo para a Escola Paraguai. Tomei
uma rua à esquerda e, enquanto olhava o celular e mexia em algum aplicativo, passei
por um grupo de adolescentes na calçada. Encostada a uma van, uma delas
comentou algo como “lá vai com o seu brinquedinho caro; não o larga, como se
tivesse, de fato, tantos amigos com quem falar”. Lembro que me invadiu um medo,
como se estivesse correndo o risco de ser assaltado e de perder meu “brinquedinho”.
Sigo
na tal rua e me dou conta de que se trata da Ludgero Pinho, onde morei até meus
doze anos, mais ou menos, e que ficava no mesmo bairro da Escola Paraguai. Estranho
é que o prédio em que morei estava em construção... Mas essa rua terminava num
valão – e eu sabia disso! – e não me levaria à Paraguai. Dei meia volta e,
ainda mexendo no celular, encarei o medo de passar novamente pelo bando de
adolescentes.
Penso
que preciso almoçar e entro num restaurante, mas logo vejo que não é um
estabelecimento onde eu tivesse coragem de comer. Ele era labiríntico e com uma
entrada na frente e outra nos fundos. Resolvo atravessá-lo, na ilusão de que a
Paraguai estaria na rua de trás. Passo por um dos corredores, e nele há três adolescentes
(!), dos quais uma mostra uma espécie de coreografia, barrando minha passagem.
Tento passar pela direita, ela vai para a direita; tento a esquerda, ela vai
para a esquerda; quando consigo enfim passar, volto-me risonho pra trás e vejo
que a moça no caixa, provavelmente mãe da adolescente, olha-a com ar de repreensão,
por me ter travado o caminho tão distraidamente.
No
corredor seguinte, também sinuoso, é onde estão os balcões com a comida para
que as pessoas se sirvam, e há uma espécie de fila, de duas pessoas, talvez com
pratos na mão. Tento passar e novamente vejo acontecer a cena da
direita-direita, esquerda-esquerda, mas agora isso me irrita – tenho uma pressa
enorme cujo motivo também me escapa. Reclamo: “não é possível! é a segunda vez
que tento passar e se põem na minha frente neste restaurante!”. Consigo sair e
vejo novas COHABs, imensas, tomando um vasto espaço com seu cenário habitual:
muita gente, ruas mal calçadas, barulho, sujeira no chão. O cenário é pobre,
cheio de COHABs e favelas – e isso me incomoda de alguma forma.
Não
é aqui que eu devia estar. Será que me perdi? Olho pra minha mão e fico
assustado: minha cutícula, enorme e macia, cresceu tanto no dedo mindinho que
agora cobre toda a minha unha, como se fosse uma capinha plástica. Como cheguei
a permitir isso? Não importa. Vou comprar um novo alicate de cutícula, porque o
meu anda meio cego, e eu não acredito muito nisso de amolar alicate de
cutícula.
Vejo
uma farmácia bem pequenina, com toda a entrada de vidro fechada por causa do ar
condicionado. Olho para dentro e enxergo, atrás do balcão, pendurado, um
Mondial, R$32,60. Achei caro. Do outro lado da rua havia duas outras farmácias;
uma delas parecia dessas Pague Menos da vida, ela é mais aberta, maior, tem
algumas estantes de produtos que ficam ao léu, assim como que na calçada. Vi
alguns alicates de cutícula desses que têm a parte de segurar de plástico; não
gosto deles; nem me dou ao trabalho de ver o preço. E é preciso retomar o
caminho para a Paraguai, pois estou me atrasando.
Ando
até uma esquina. Do outro lado da rua passa um valão e eu acho que devo seguir
à direita, mas alguém, que agora me acompanha, repara que a Escola fica do
outro lado da linha do trem, apontando para o outro lado do valão. Eu concordo,
com um sentimento de frustração por ter errado um caminho que me era tão
familiar. Acho que não vou chegar lá.
Acordei
com calor, já procurando o controle do ar para baixar a temperatura no quarto.
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