sexta-feira, dezembro 28, 2012

A condição da felicidade



Há em Un balcon en forêt, de J. Gracq, uma passagem que deixa a crítica muito intrigada. O aspirante Grange, em serviço perto da fronteira belga durante a “maldita guerra”, recusa uma transferência que o tiraria da linha de frente de combate. Ora, nos diz o texto, a recusa de Grange não se explica nem por “uma questão de honra”, nem pelo desejo de ficar perto de Mona, sua jovem amante. Se Grange se recusa a deixar a fortaleza de Ardennes, da qual ele tem o comando, é porque se sente “respirar como nunca antes”. Como explicar que uma situação tão desconfortável (a expectativa do efetivo início da guerra) permita “respirar melhor”? Em que a perspectiva de um acontecimento penoso pode ser uma condição de felicidade? Encontramos uma explicação em um dos primeiros textos de Gracq, Un Beau ténébreux, bem anterior ao Balcon en forêt. O personagem Allan se dirige nos seguintes termos ao narrador, Gérard:

A verdade é triste, como você bem sabe. Ela desilude porque restringe. [...] Ela é pobre, ela desmobila e despoja. Mas quando uma verdade se aproxima [...] mesmo ainda apenas pressentida, faz-se na alma dilatada para recebê-la um desabrochar amoroso [...].


Se a felicidade está na “aproximação” do acontecimento (e não no contato com ele), é porque a expectativa permite a plena presença do mundo. A perspectiva de um acontecimento temido, pela intensidade que ela confere aos instantes que o precedem, reforça a relação de intimidade que nos une ao todo.

Vincent Jouve, in Por que estudar literatura?,
trad. Marcos Bagno e Marcos Marcionilo

Um comentário:

Unknown disse...

impressionou-me isso...