segunda-feira, outubro 19, 2009
sábado, outubro 17, 2009
JdF 3 : Alok 1
Ai, meu Deus, não é possível. Será que ele vai ficar ali muito tempo? Fico me perguntando o que teria sido se eu tivesse descido do ônibus, não o tivesse visto e tivesse simplesmente feito o meu caminho até ao final da rua, até ao portão da Pousada. Ai, melhor nem pensar.
Como é mesmo que eu faria? Ah, tá. Lembrei: trepo naquela madeira, subo pela escadinha que fazem as linhas de farpado da cerca, subo na marquise. E depois? Fico lá em cima eternamente. Ai, te acalma, bi, vai dar tudo certo. Ele nem te viu aí. Fica quietinha, nem respira, ele não te viu. Ai, meu Deus, ele me viu.
Cristo Jesus! ele tá vindo pra cá? ai, Pai, ele tá vindo pra cá!
Ai, merda, solta. Puts, se meu pé ficasse preso naquela farpa do arame eu nem sei o que tinha sido. Se bem que... ai, inferno, será que ele vai ficar ali latindo até quando?
Um carro. E eu faço o quê? Aceno, SOS em código Morse? Peço a Deus a morte, é isso que eu faço. O povo é foda mesmo. Agora vê... eu aqui em cima, trepado, o cara passa de carro, põe meia cabeça pra fora como quem diz que você ta fazendo aí?, não pergunta, não dá meia parada, vai-se embora. E eu aqui nessa situação. Nessa roça. Quanto de Juiz de Fora será que é roça isolada igual a isso aqui? Jesus, se eu vier pra cá, vou querer morar no Centro. Lá é tão bonitinho.
Mais um? Arrarrá. Vou morrer aqui. Não é possível. Que é que eu faço? Descer daqui nem a pau. Que horas são, hein? Jesus, passa da meia-noite. E a prova é amanhã. Que lindo. Plena véspera da prova teórica do concurso, e eu aqui, linda e loira, em cima do telhado dum ponto de ônibus. Pensa, Everton, o que você faz, o que qualquer um faria num momento de total desespero?
(Pega o celular.)
“Alô, Mãe?”
segunda-feira, outubro 12, 2009
Segundo interlúdio
sábado, outubro 10, 2009
JdF 2: Alok 2
Depois de os alunos terem entrado, se sentado e se ajeitado na sala, ela se apresenta e explica que vai contar uma estória com duas personagens: Paulo e o seu mulinho. Apresenta os dois numa figura projetada na parede e vai contando a historinha, repetindo frases com os alunos mesmerizados, provavelmente se perguntando de onde saiu aquela louca. Que contava uma história, que dava aula, que ensinava. Que falava latim.
segunda-feira, outubro 05, 2009
Primeiro interlúdio
sábado, outubro 03, 2009
JdF 1: Alok 3
Intocável, na sua calça jeans de lycra, lá ia ela, louca como sempre, deitadinha, tranqüilinha, como se nada estivesse acontecendo, como se nem fosse com ela. Do lado de fora lá fora, uó uó uó da sirene. A última vez que tinha ouvido aqueles barulhos tinha sido depois do seu último afogamento, quinze minutos nágua, e o resgate, lembrava bem, feito por um surfista dos braços abastados.
E foi parar na Santa Casa, horas e horas de soro. Desta vez acompanhada dum moreno.
Tudo começou assim: vamos fazer um exame, vamos tirar líquor da sua espinha. Pra quê? Uai, como sempre, pra ver se ela se abalava, devia ser. Pra que mais se fazem esses exames absurdos, minha gente? Me explica pra quê-por quê alguém vai enfiar uma agulha longa na sua espinha e tirar a agüinha que está quietinha lá, segurando o cérebro da pessoa boiando lá no topo? Só pode ser teste de paciência. Esses médicos têm formas e mais formas de testar a paciência do paciente.
“Se a sua cabeça doer muito amanhã, você vai pro Pronto Socorro e diz que fez extração de líquor. Eles saberão o que fazer: vão te pôr no soro”, disse a médica. Isso na quarta. Aí na quinta-ontem, a cabeça doía, mas ela foi pra cama, que ela não era boba nem nada. Queria era dar a sua aula de Latim e ser feliz no dia seguinte.
Mas no dia seguinte, depois do almoço, depois duma caminhadinha no Sol e do balanço chique-chique do ônibus até chegar no câmpus, a cabeça resolveu fazer tóinho-nhóim e simplesmente dilatar até quase explodir. E pensar que hoje era o dia dos particípios... Quanta frustração cabe numa vida, meu Deus.