Para o Tigrinho de Pelúcia
Foi uma viagem cheia de problemas. Ou de aventuras, dependendo da sua forma de ver as coisas. O fato é que eu tinha sido furtado, tinha perdido, logo numa das primeiras semanas, pouco mais que 600R. Isso na hospedagem em que estava, dividindo quarto com um moço do Uruguai.Mas eu não desci do salto facilmente: também o Ares estava no Sul, e ele acabou me emprestando o dinheiro necessário para repor a perda.
Agora estava eu ali, no aeroporto de Porto Alegre. Era pra ser rapidinho, fim indolor de viagem. Mas a gente sabe que desgraça pouca é café pequeno, e eu cometi um erro: despachei a minha bagagem de mão com cartões de banco e de crédito dentro. Tinha comigo um dinheirinho de bolso e uma bolsa que carregava as minhas leituras, entre as quais estava O Gaúcho, do José de Alencar. Daí, com o atraso de quase três horas que acabou tendo o meu vôo, eu o descubro, numa das minhas inúmeras andadas pelo aeroporto.
Ele estava lá. Radiante, bem-humorado, de pernas cruzadas, lá em cima, com o seu ar superior, olhando para todos com um pouco de sobrançaria. E ele era lindo. Foi paixão à primeira vista. Mas eu não podia trazê-lo comigo naquele momento, então escrevi pro Ares:
Oi, guri, tudo bem?
Estou aqui no aeroporto, tentando voltar pra casa faz umas boas duas horas. O meu vôo, das 11h40min, foi pras 13h40min e, mais tarde, pras 15h. Esperemos que não se atrase mais que isso.
Estou aqui no aeroporto, tentando voltar pra casa faz umas boas duas horas. O meu vôo, das 11h40min, foi pras 13h40min e, mais tarde, pras 15h. Esperemos que não se atrase mais que isso.
Não liguei porque pretendia fazer isso aqui do aeroporto, antes de embarcar, mas o cansaço me fez mandar no check-in também a mochila que estava com todos os meus cartões, endereços, etc. e tal. Fiquei só com a tiracolinho de pano com as minhas leituras, a passagem e a minha identidade.
Nas andanças pelo aeroporto, que tampouco não estavam previstas, dei de cara com uma lojinha, logo no sopé das escadas rolantes, à direita de quem entra no aeroporto, chamada "Arte do Sul" (ou algo assim); entrando na loja, logo à esquerda, pendurado, está um tigre de pelúcia de 58R e bolotinha. Como eu não tenho mais esse dinheiro aqui, pensei em te explorar... Se eu puser 60R a mais no depósito que te farei no mais tardar amanhã, será que você não passava por lá no dia do seu embarque e pegava o tigrinho pra mim? Por favooooooooooooooooor... rs.
Um beijinho procê,
Everton
E assim começou uma longa espera, que eu já não me lembro quanto tempo durou, pela chegada do Ares. Quando ele veio, para o meu total desencanto, ele não tinha conseguido me comprar o tigrinho de pelúcia. Coitado: chegando ao aeroporto de POA, ele se deu conta de que tinha esquecido a carteira na cidadezinha de interior onde fica a casa dos pais. Meia-volta, inteiro atraso, desencontro. Nada de tigre.
Passei então por umas muitas lojas de brinquedos e pelúcia em São Paulo. Olhava bichinhos, conhecia marcas, falava com vendedoras... nem uma esperança. Até que um dia, uma dessas vendedoras de verdade me pergunta interessadamente o que eu procurava.
"Um tigre de pelúcia. Ele é grande assim, ó, e tem tronco e cabeça mais ou menos do mesmo tamanho. Os braços e as pernas são longos assim, e ele tem velcro nas mãos, pra fazer ele ficar pendurado tipo um agarradinho."
"Ah, eu sei qual é. Ele faz parte de uma coleção da Buba. A gente deve receber lá pro fim de março, mas eu já vi no catálogo."
Nada como um vendedor competente. Ou louco. Porque eu não creditei muito nela, não. Eu tava meio desacreditado, sabe? Mas não custava esperar. Quer dizer... custar, custar, custava. Inda mais que, na maioria das vezes, quando eu tenho que esperar, eu acabo esquecendo. Paixão, aliás, é bem assim: strike while the iron is hot. Se deixar esfriar, não vira.
E eu esqueci, claro. Até passar na frente de uma loja, um dia, do nada, e bater de novo os olhos no bichinho. Se eu tivesse trilha sonora pra minha vida, naquela hora teria ouvido o Caetano Veloso:
Passei então por umas muitas lojas de brinquedos e pelúcia em São Paulo. Olhava bichinhos, conhecia marcas, falava com vendedoras... nem uma esperança. Até que um dia, uma dessas vendedoras de verdade me pergunta interessadamente o que eu procurava.
"Um tigre de pelúcia. Ele é grande assim, ó, e tem tronco e cabeça mais ou menos do mesmo tamanho. Os braços e as pernas são longos assim, e ele tem velcro nas mãos, pra fazer ele ficar pendurado tipo um agarradinho."
"Ah, eu sei qual é. Ele faz parte de uma coleção da Buba. A gente deve receber lá pro fim de março, mas eu já vi no catálogo."
Nada como um vendedor competente. Ou louco. Porque eu não creditei muito nela, não. Eu tava meio desacreditado, sabe? Mas não custava esperar. Quer dizer... custar, custar, custava. Inda mais que, na maioria das vezes, quando eu tenho que esperar, eu acabo esquecendo. Paixão, aliás, é bem assim: strike while the iron is hot. Se deixar esfriar, não vira.
E eu esqueci, claro. Até passar na frente de uma loja, um dia, do nada, e bater de novo os olhos no bichinho. Se eu tivesse trilha sonora pra minha vida, naquela hora teria ouvido o Caetano Veloso:
Gosto muito de te ver, tigrezinho
Caminhando sob o sol
Gosto muito de você, tigrezinho
Para desentristecer, tigrezinho
O meu coração tão só
Basta eu encontrar você no caminho
Daí eu o comprei. Foi bem mais barato do que teria sido no aeroporto de Porto Alegre.
E vivemos felizes para sempre, claro.
Um comentário:
Emocionante!
Já mandei o link pro Almodóvar pra transformarmos isso em filme até o próximo verão.
Me respondeu agora há pouco: "Qué te hace pensar que ya no leo el blóguite de Everton todos los días, cariño!?" xD
Postar um comentário